terça-feira, 1 de junho de 2010

A Ilegalidade Na Esplanada dos Ministérios com parentes Indígenas

UNIÃO, AMPARADA POR JUSTIÇA E POLÍC IA, DEFENDE A ILEGALIDADE ou As Artimanhas Desastrosas do Dr. Galli Para Tirar o AIR dos Holofotes MMF. No fim da manhã da última sexta-feira, dia 28 de maio, quando completavam seis meses do sangrento decreto 7056/09, que obrigou representantes indígenas de todo o país a acamparem em protesto, na Esplanada dos Ministérios, contra a medida que extinguia Postos, Administrações Regionais e direitos adquiridos, o advogado Arão da Providência, indígena da etnia Guajajara indicado para a presidência da Funai pelos militantes do Acampamento Indígena Revolucionário recebeu no Rio de Janeiro um telefonema da Superintendência da Polícia Federal, em Brasília, convocando-o a comparecer naquele mesmo dia, às 18 horas, na sede da PF, no DF, acompanhado das lideranças do AIR, “sem a presença de mulheres ou crianças”. Naquele mesmo momento, em Brasília, três indígenas – um desses, ligado ao Conselho Indígena Missionário (CIMI); outros dois, figuras constantemente vistas no edifício-sede da Funai – saíram do prédio do Ministério de Justiça, caminharam uns 30 metros e dali acenaram para o outro lado da avenida, chamando uma liderança do Acampamento Indígena Revolucionário para conversar. Ao invés de conversa, foi entregue à liderança indígena do acampamento um bilhetinho com o telefone do delegado Galli, da PF, pedindo que entrasse em contato com urgência e que comparecesse às 18 horas na Superintendência da Polícia Federal “acompanhado apenas das lideranças, sem presença de mulheres e crianças”. Apesar da insistência de amigos e apoiadores para que os caciques não comparecessem à PF às 18 horas de sexta-feira sozinhos, o que parecia ser uma cilada, representantes e lideranças indígenas – homens e mulheres sem nada a temer, pois defendem a Constituição, acompanhados de uma criança – resolveram ir à Superintendência junto com os advogados Karla Pinhel e Ubiratan Wapichana - porém, aguardando o também advogado Arão da Providência, que ainda chegava do Rio, se atrasaram bastante. Quando o relógio bateu exatamente 18 horas, um oficial de justiça trouxe ao acampamento indígena, instalado na Praça dos Três Poderes, uma intimação da 6º Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal, assinado pela Juíza Federal Substituta Maria Cecília de Marco Rocha e tendo a União Federal como autora, dizendo que o Acampamento Revolucionário Indígena – réu - deveria se afastar um quilômetro do Ministério da Justiça enquanto ocorresse – nos dias 31 de maio e 1º e 2 de junho de 2010 – a Reunião Ordinária do CNPI, da qual “participam apenas representantes especialmente convidados”, contando – nessa edição – com a presença do presidente Luis Inácio Lula da Silva, 18 ministros de Estado, representantes indígenas, de organizações indigenistas e da sociedade civil. No momento em que o oficial trouxe a intimação ninguém assinou nem tocou no documento, com militantes afirmando serem analfabetos – não podendo, portanto, assinar. Em dado momento, o oficial de justiça se viu cercado pelos curiosos e se sentiu ameaçado – jogando o documento no chão e saindo correndo. O Mandado de Interdito Proibitório nº 611/2010, da 6ª Vara Federal, tem a finalidade de fazer que os indígenas“se abstenham de invadir o edifício-sede do Ministério da Justiça e de bloquear as vias de acesso às suas dependências, devendo guardar a distância de mil metros (1 km) da entrada do prédio” - determinando ainda que a Polícia Militar e a Polícia Federal façam cumprir a decisão. A idéia de que alguém poderia invadir o prédio só pode ter saído de uma cabeça do CNPI, o Mandado de Interdito Proibitório – do qual a União é autora é um caso flagrante de atentado à democracia, uma violação da liberdade de expressão, impedindo que uma manifestação legítima de oposição ao atual governo se expresse, além de rasgar a Convenção 169 da OIT, que determina que os povos devem ser consultados sobre medidas que os afetem - como as decisões que serão tomadas na reunião entre CNPI (Márcio Meira), a Presidência da República, os Ministérios e os indígenas escolhidos a dedo pela atual gestão. O documento da Juíza Federal Maria Cecília de Marco Rocha cita ainda “a invasão da Câmara dos Deputado no dia 19 de maio”, o que as fitas de vídeo comprovam ser CALÚNIA – os indígenas entraram dançando normalmente na Casa do Povo, entregando suas bordunas e arcos à PF: quem invadiu o acesso ao Salão Verde, barrando a entrada de manifestantes, foi a Polícia Legislativa. Tanto a Juíza quanto o Governo Federal – Presidência da República, Casa Civil da Presidência da República, Secretaria-Geral da Presidência da República, Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, Ministério de Minas e Energia, Ministério da Saúde, Ministério da Educação, Ministério do Meio Ambiente, Ministério do Desenvolvimento Agrário, Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Ministério da Defesa e Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão – elegem a ILEGALIDADE ao se sentarem com o CNPI para trabalhar: a lei que instituía o Conselho, emenda 36 da MP 472, foi rejeitada por maioria na Câmara dos Deputados no dia 19 de maio de 2010. No dia 25 de maio de 2010, um ofício do gabinete do deputado federal Marcelo Ortiz levava ao conhecimento do Ministro da Justiça, Luiz Paulo Teles Ferreira Barreto, ao Procurador Geral da República, Roberto Monteiro Gurgel Santos, à SubProcuradora Geral da República, Deborah Duprat, e ao próprio presidente da CNPI, Márcio Augusto Freitas de Meira, que na apreciação da MP 472/09 a emenda 36, a criação do Conselho Nacional de Política Indigenista, foi rejeitada pela maioria em plenário, sendo, portanto, a organização chefiada por Márcio Meira – hoje reunida na chácara do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), amanhã no Ministério da Justiça com representantes do atual governo – legalmente inexistente. Portanto, o mandado expedido pela 6º Vara da Seção Judiciária do DF, publicado no dia 26 de maio, intimando os indígenas do AIR – que pregam radicalmente a defesa da Constituição Federal - a não constrangerem com seus protestos membros de um conselho inexiste (ilegal) e totalmente baseado em uma suposição (a de que os manifestantes invadiriam o prédio do Ministério da Justiça), é, no mínimo, contraditório e ineficaz – sem citar o teor paranóico da justificativa. Além do mandado judicial ter como objetivo proteger a reunião de um conselho inexistente (ou ilegal), sendo contraditório e ineficaz, a Juíza, segundo assessoria jurídica do Acampamento, usou um instrumento equivocado: o interdito proibitório só existe quando há posse e propriedade, não se aplicando de forma alguma a uma praça pública reconhecida historicamente como palco legítimo de manifestações e protestos de toda ordem. Mais do que equivocado, a justificativa apresentada - “risco de esbulho”, sendo esbulho entendido como “a retirada forçada do bem de seu legítimo possuidor” – inverte a situação apresentada: o bem mais sagrado, no caso, o direito à consulta prévia e à informação, usurpado pelo CNPI dos indígenas brasileiros, seus legítimos donos, só poderia se materializar caso se invertesse o teor da liminar, abrindo acesso – aos indígenas de todo o Brasil – ao Ministério da Justiça e a os todos prédios públicos onde se discutam decisões e medidas que afetam os destinos dos povos nativos brasileiros, como propõe a Convenção 169. A estratégia da 6º Vara Federal, articulada com a Polícia Federal, entregando a intimação somente às 18 horas de sexta-feira, fora do horário forense, com as repartições fechadas, negando ampla defesa e> direito ao contraditório e, para agravar, em um momento em que as lideranças supostamente estariam em reunião na Superintendência da PF, foi a de que os líderes do Acampamento Indígena Revolucionário não tomassem ciência do teor da acusação – ficando fragilizados e não podendo assim se defender. O interlocutor escolhido pelo governo para dialogar com os indígenas descontentes mostra o quanto a atual gestão federal preza o respeito pelos povos originário: o delegado, dr. Galli, é citado por índios das mais diversas etnias como torturador e arbitrário. No dia 30 de junho de 2009, o dr. Galli prendeu na porta da Funai, diante de dezenas de testemunhas, os irmãos Antonio e Anacleto, do Grupo Wassu da Aldeia Serrinha – que horas antes estiveram na 6ª Câmara de Coordenação e Revisão, onde foi encaminhado à Funai um ofício pedindo reconhecimento da comunidade em que nasceram como indígena – sob a alegação de que não eram índios e, sim, vagabundos. Condenados no Tribunal Étnico do dr. Galli, os irmãos foram levados à Polícia Federal, onde, segundo afirmam indígenas, foram despidos e espancados. De acordo com a denúncia apresentada na ONU e enviada à OIT, o dr. Galli ordenou que fosse arrancado da pele o jenipapo das pinturas corporais dos dois com uma bucha – sendo ambos salvos da sessão de tortura pela intervenção do dr. Wellington Mesquita, ex-procurador da Funai. Na mesma noite, a equipe do dr. Galli proibiu o grupo Krahô de Rio Formoso – sem recursos para hospedagem e sem amigos ou parentes na cidade que os acolham – de dormir no primeiro andar do prédio da Funai, onde pernoitavam. A reunião ocorrida sexta-feira, dia 28 de maio de 2010, na Superintendência da Polícia Federal, de representantes e lideranças do AIR com o dr Galli e monitorada por um agente que gravava toda a conversação em vídeo, mais para documentar rostos e linhas de raciocínio do que para registrar uma negociação (pois não houve negociação alguma), foi de uma irregularidade total. O dr. Galli, revestindo um verniz de estudada elegância e polidez e supondo ser o único na sala a saber do conteúdo da intimação, não tomou em nenhum momento a iniciativa de esclarecer a situação e dar ciência dos fatos, se limitando repetir que “saiu uma liminar” – e, de posse dessa informação, engendrar “negociações” em nome do Governo do Distrito Federal, da Polícia Federal e do Ministério da Justiça, dizendo a todo o momento que bastaria um telefonema seu a Luiz Paulo Barreto, Ministro da Justiça, para avalizar qualquer decisão tomada ali. De má-fé o delegado manipulava as informações, dando como certa uma desocupação da Esplanada por uma questão de ordem pública – quando, na verdade, como pode-se ver no mandado, se trata de uma questão política – e, entre outras propostas, oferecia, em nome do Governo do DF e do Ministério da Justiça, o estacionamento do Estádio Mané Garrincha (longe dos Ministérios e do Congresso Nacional), “com logística, infra-estrutura e saneamento”, para que ali o Acampamento Revolucionário Indígena se instalasse. Durante a negociação, que durou cerca de 4 horas, não foi citado em nenhum momento pelo dr. Galli que a liminar pedia simplesmente para “se abster de invadir o prédio-sede do Ministério da Justiça” e “de bloquear as vias de acesso”, concluindo que o acampamento deve ser deslocado a uma distância de 1 km da entrada do Ministério durante o período de realização da Reunião Ordinária do CNPI. A omissão do conteúdo da decisão judicial faria, caso os indígenas não soubessem o teor do documento, que esses se sentissem ameaçados por uma desocupação iminente. E a suposição de que esses se sentiam ameaçados fez com que o negociador do governo se sentisse à vontade. O delegado jogou com a suposta ignorância de seus interlocutores, dando a entender que suas propostas, supostamente vindas antes da entrega do mandado judicial (do qual os militantes nada sabiam) e oriundas do Ministério da Justiça, dariam a oportunidade para que os indígenas continuassem a se manifestar “de forma digna” e que poderiam ser recebidos pelo Ministro da Justiça. Houve a oferta, em nome do Ministro da Justiça, que o acampamento fosse desfeito e que os seus líderes ficassem hospedados em hotéis, com alimentação digna, com todo o conforto custeado pelo Estado Brasileiro, além da promessa de se sentar à mesa com Luiz Paulo Barreto – o que foi recusado. Como alegado por um militante, sentar com o Ministro da Justiça – com os antecedentes que tem, como autor da portaria que manda a Força Nacional a atirar em indígenas – não era garantia alguma de derrubar o decreto ou o atual presidente da Funai. Diante da reticência dos indígenas acampados em aceitar as propostas, o delegado, em um ato de desespero, propôs que, “num gesto de boa vontade”, 50% do acampamento se retirasse de Brasília, ficando o restante no mesmo lugar - negociando, assim, 50% da decisão judicial da Juíza Substituta Maria Cecília de Marco Rocha, praticando uma ilegalidade que, no exercício da função, é crime. Não satisfeito, o delegado quis fixar um prazo para que os indígenas acampados decidissem se retirariam 50% dos militantes ou não afirmando que a partir de sábado, dia 29, se iniciaria a operação tática para remoção e que só “um gesto de voluntário de boa vontade” poderia deter a máquina do Estado. Quando soube, ao fim da reunião, que os representantes e lideranças indígenas, assim como os advogados, já conheciam de antemão o interdito assinado pela Juíza Maria Cecília de Marco Rocha, em uma reunião gravada em vídeo tanto pela polícia quanto pelo AIR o delegado desmoronou. O discurso do dr. Galli, que fugia totalmente do teor do processo, revelou ainda a incompetência da inteligência da PF, ao afirmar que “uma etnia do Maranhão se encontra insatisfeita, querendo ir embora do DF”, quando os Guajajara (Tenetehara) são, desde o dia 18 de abril, o grupo que mais cresce no Acampamento Revolucionário Indígena, chegando novas levas toda a semana, trazendo guerreiros e guerreiras cheios de entusiasmo para derrubar o decreto e a atual presidência da Funai. Desde a pressão na Superintendência da Polícia Federal da última sexta-feira, dia 28, advogados e jornalistas, entre outros apoiadores, estão em vigília no Acampamento Revolucionário Indígena da Esplanada dos Ministérios, aguardando o desdobrar dos acontecimentos e prontos para a ação. Domingo (ontem), por volta das 14 horas, uma linda menina Guajajara teve a sua primeira menstruação, obrigando - de acordo as crenças e as tradições da etnia – família e comunidade a colocá-la na reclusã (“tocaia”), não comendo carne nem feijão e tendo contato somente com mulheres, entre outras interdições, até o próximo sábado, quando sairá do espaço fechado onde se encontra “presa” no interior da oca para a Festa que a receberá. Desde ontem a comunidade – Tekohaw – do Acampamento Revolucionário Indígena, reconhecida pela Justiça Federal, se encontra em festa, com o maracá tocando até o amanhecer. O Acampamento Revolucionário Indígena lembra que, de acordo com o artigo 231 da Constituição Federal, é assegurada a proteção de usos, costumes, crenças e tradições, assim como a Lei 6001, significando, portanto, que, tendo uma menina na tocaia – presa no interior da oca, deitada na rede e só se alimentando de peixes - até o próximo sábado, o acampamento não pode se deslocar. A Vida nos brinda com mais esse presente. Enquanto o Governo Federal - articulado com Justiça e Polícia Federais - tenta institucionalizar a ilegalidade, o Acampamento Revolucionário Indígena segue em sua luta de cabeça erguida – celebrando o Amor, a Beleza e a Vida - com muita Garra, Alegria e Vontade de Viver.